Escalada das importações brasileiras de resinas commodities


Engorda dos desembarques em 2023 reflete nova realidade mundial e local

Corre no setor plástico que, no Brasil, todo ano tem seu quê de atípico. Ainda assim, 2023 extrapolou essa moldura ao agrupar no balaio de fatos marcantes algumas ocorrências globais e locais até então pouco consideradas ou ausentes dos costumeiros diagnósticos sobre desempenho do mercado. E elas devem continuar em campo em 2024, a exemplo do caldeirão climático, a produção em brasa de flexíveis na Zona Franca e o viés de baixa nos preços internacionais de materiais como poliolefinas e PVC, às voltas com avassaladores excedentes mundiais de materiais como poliolefinas e PVC. Reflexo dessa conturbação é o saldo de 2.275.628 toneladas de resinas commodities importadas pelo Brasil no último período, acima das 1.910.988 toneladas internadas em 2022, delimita meticuloso rastreamento dos indicadores oficiais pela equipe de assuntos de comércio exterior da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim).

No plano geral do mercado interno das resinas, o consenso entre os analistas é de que o resultado do último exercício reflete, em sua maior parte, a conjuntura de 2022. Ou seja, aumento das vendas de bens essenciais, não duráveis e de giro rápido, como alimentos ou produtos de limpeza, uma vez que a inflação e juros altos, crédito impraticável e endividamento das famílias enregelaram o consumo de bens duráveis em 2023, como exemplificam a produção automotiva (2.32 milhões de veículos) 1,9% inferior ao total anterior, a retração de lançamentos imobiliários e o recuo estimado em 6% na receita e de 8% na produção de eletroeletrônicos.

O surto de expansões ainda em curso nas capacidades instaladas na Ásia e EUA explicam, ao lado da demanda mundial enfraquecida e de limitações (pontuais e estruturais) na oferta brasileira de determinados grades, a supremacia de PE e PP entre as importações de termoplásticos convencionais no último período. A Braskem monopoliza o fornecimento nacional, com capacidades de 1.850 milhão de t/a em PP e 2.295.000 de t/a em PEs.

Salto das poliolefinas

No caso de PP, as importações em 2023 emplacaram 509.467 toneladas contra 425.215 em 2022. Entre as origens, a China respondeu por 45.856 toneladas internadas contra 47.518 precedentes; os EUA internaram 25.495 toneladas, bem acima das 6.560 do ano anterior e da Argentina vieram 44.718 toneladas, atrás das 67.374 remetidas um ano antes. No plano dos desembarques por portos incentivados, entraram por Santa Catarina 277.164 toneladas de PP em 2023 versus 216.639 em 2022. Pelo porto livre de Manaus, as importações do polímero acumularam 93.622 toneladas no ano passado perante 87.569 no exercício anterior. No cercado de PEs, as importações do tipo de alta densidade (PEAD) somaram 449.835 toneladas em 2023 contra 360.239 anteriores. Uma parcela de 109.022 toneladas desembarcou no ano passado por Manaus, aquém das 128.542 toneladas por ali internadas no período precedente, e 185.807 toneladas entraram em 2023 pelos portos subsidiados catarinenses, mais que as 118.090 que por ali ingressaram no país em 2022. Entre os países exportadores, a China compareceu nas importações brasileiras de PEAD com irrisórias 5.495 toneladas no último exercício, atrás das 7.455 registradas em 2022. Dos EUA, entraram 266.079 toneladas em 2023, bem acima das 192.030 trazidas no ano anterior. Por fim, as remessas da Argentina, a cargo do complexo da Dow, alcançaram 77.020 toneladas no ano passado, de leve à frente das 74.862 internadas em 2022.

O monitoramento do governo (Sistema Comex) une no mesmo bojo as importações das resinas de baixa densidade (PEBD) e de baixa densidade linear (PEBDL). A propósito, a capacidade brasileira de PEBD (675.000 t/a a cargo da Braskem) já foi superada há anos pelo consumo interno. Pois no ano passado os desembarques de PEBD e PEBDL fecharam em 417.462 toneladas perante 397.325 anteriores. A China teve mini participação, com 1.021 toneladas trazidas no período passado e 2.383 no saldo de 2022. Em contraste, os EUA colocaram no país 289.533 toneladas em 2023, acima das 268.531 anteriores. Da Argentina, vieram da Dow 39.334 toneladas de PEBD e PEBDL no ano passado, mesmo patamar das 40.598 internadas em 2022. Entre os canais de desembarque, foram internadas em 2023 por Manaus 208.995 toneladas dos dois polímeros, de leve abaixo das 213.721 registradas em 2022. Já pelos portos de Santa Catarina ingressaram no mercado interno 93.379 toneladas importadas de PEBD e PEBDL versus 66.323 em 2022. Os indicadores de PE levantados pela Abiquim não incluem os copolímeros de etileno e alfa-olefinas que, segundo Simone de Faria, diretora da consultoria Townsend, registraram importações brasileiras da ordem de 500.000 toneladas no ano passado.

PVC: insuficiência doméstica             

Dois desastres geológicos, em 2018 e 2023, causados pela mineração de sal gema (insumo da cadeia soda cloro) pela Braskem em Alagoas impregnaram de incertezas as projeções sobre a real capacidade produtiva de PVC no Brasil. A capacidade instalada nominal, unidas as plantas da Braskem e Unipar, é dimensionada em 1.010 milhão de t/a. Desse total oficial, cabem 710.000 toneladas para a Braskem e 300.000 para Unipar. Em 2023, ano morno para a construção civil, as importações brasileiras do vinil evidenciaram a insuficiente oferta doméstica da resina – atingiram 425.981 toneladas, volume superior às 351.094 internadas um ano antes. Por sinal, tal como em 2022, as importações brasileiras de PVC foram lideradas no último período pela Colômbia, com 192.826 toneladas despachadas planta da mexicana Orbia, controladora também da transformadora Amanco Wavin no Brasil. Bons corpos atrás, o rol dos maiores exportadores de vinil para cá em 2023 se completa com os EUA, com 82.985 toneladas, e Taiwan, com 51.389.

PET: importações com excedente local

Somadas as operações da Alpek e Indorama em Pernambuco, a capacidade instalada nacional de PET virgem resulta em 1 milhão de t/a para um consumo interno da ordem de 688.000 toneladas em 2022 e previsão de 3% a mais em 2023, segundo a marcação da Associação Brasileira da Indústria do PET (Abipet).

Apesar da sua capacidade excedente, o Brasil importou 74.430 toneladas do poliéster para embalagens em 2022 e 114.352 no ano passado, o que a Abipet atribui a questões logísticas (dimensões continentais do país) e acordos mundiais entre brand owners, transformadores de pré-formas e produtores da resina.

PS: internações superam 90.000 t

Outra referência de crônica superoferta na petroquímica brasileira é o reduto de PS. Inova e Unigel, os produtores locais, somam capacidade instalada de 605.000 t/a enquanto a voz corrente extraoficial situa o mercado interno deste ano na órbita de 370-380.000 toneladas, abaixo da faixa arredondada em 400.000 em 2022. No último período, o movimento de PS levou ferroadas em mercados que respondem por 60-65% do consumo do polímero. O encarecimento da alimentação fora do lar e dos serviços de delivery, abalaram o movimento de embalagens e descartáveis de PS, polímero também criticado por ambientalistas por seu uso em repudiados produtos de uso único (copos, potes, bandejas, talheres etc.) e por singularidades de sua reciclagem.

PS também gramou maus bocados em 2023 com o recuo nas vendas internas para peças da linha branca (geladeiras, em especial), dependentes em sua maioria de compras a prestações inviabilizadas pelos juros altos e crédito inacessível. Diante desse cenário, uma possível justificativa para as importações brasileiras de 91.547 toneladas em 2023 (acima das 60.297 trazidas em 2022) foram as paradas de duas plantas: da unidade da Innova na Zona Franca, devido à seca sazonal ultra intensa que, no quarto trimestre, sustou recebimentos e entregas pelo porto de Manaus, e da fábrica da Unigel em São José dos Campos (SP), por força da crise financeira da empresa. Innova e Unigel também operam verticalizadas no estireno, totalizando capacidade instalada brasileira de 540.000 t/a no Brasil para um mercado estacionado há anos na marca das 600.000, incluindo os usos do monômero em PS, poliéster insaturado, elastômeros, tintas etc. Pois mesmo com as referidas interrupções na produção do polímero pelas duas empresas, o Brasil importou 215.988 toneladas do monômero no ano passado contra 185.088 no exercício anterior. A título de adendo, em 2018 o consumo aparente de estireno era dimensionado pela consultoria MaxiQuim em 603.000 toneladas, decorrente da produção local de 445.000 toneladas, importações de 159.000 e exportação simbólica de uma tonelada.

PA 6 e 6.6: freio puxado

Poliamidas (PA) 6 e 6.6 são os plásticos mais consumidos no Brasil. O tipo 6.6 é a única resina nobre polimerizada no país, mérito da Basf, à frente de uma capacidade nominal estimada extraoficialmente na praça em 15-20.000 t/a. Daí a relevância das importações dessas duas resinas (destaque para os tipos sem carga) para serem beneficiados por componedores locais. Ocorre que a indústria automobilística compõe o grosso do mercado interno de PA 6 e 6.6 e, em suma, 2023 não foi um ano engatado em quinta para autopeças no Brasil onde, mais uma vez, as montadoras produziram o equivalente a 50% de sua capacidade instalada da ordem de 4.5 milhões de veículos. Foram fabricadas 2.32 milhões de unidades, cerca de 2% a menos que em 2022, resultado decorrente dos juros altos inibindo as compras por financiamento de bens duráveis como carros. Daí o recuo nas importações de PA e 6.6 que, pelo escrutínio da Abiquim, passaram de 57.300 toneladas em 2022 para 50.996 em 2023.

(Fonte: Plásticos em Revista, 16 de janeiro de 2024)