A indústria de alimentos e o impulso para a cadeia de reciclagem do plástico


Caio Prado, executivo do setor de embalagens, defende o desenvolvimento de um arcabouço regulatório estruturado para que o setor alimentício possa ter acesso a embalagens a partir de conteúdo reciclado.

É com otimismo que acompanhamos recentemente a aprovação do Projeto de Lei nº 4.035/2021, que isenta a cadeia de reciclagem do PIS e Cofins na venda de insumos às indústrias. A iniciativa de desoneração do segmento tende a trazer um impacto importante no custo dos produtos com conteúdo reciclado e, assim, ampliar o avanço da circularidade, principalmente na cadeia do plástico.

No Brasil, enquanto as embalagens de alumínio e, também papel e papelão, já estão bem adiantadas no quesito reciclagem, não há dúvidas de que é preciso dar passos mais largos em relação ao plástico.

Segundo a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (ABIPLAST), a reciclagem de embalagens plásticas no Brasil cresceu 14,7% em 2021, chegando a 1,07 milhão de toneladas. Esse número representa 23,4% do total de embalagens plásticas pós-consumo produzidas no país.

Como indústria de embalagens, vemos que a demanda por materiais sustentáveis continua crescendo e estimulando a inovação, comportamento fruto do avanço das políticas de ESG, e que deve se tornar mais acessível a partir de iniciativas como o projeto de lei que habita no congresso atualmente.

Se por um lado, indústrias de eletrônicos, beleza, varejo e outros já têm ao seu alcance possibilidades de reduzir seu impacto ambiental a partir do uso de embalagens com conteúdo reciclado, a indústria de alimentos ainda enfrenta um desafio para utilizar plástico reciclado em suas embalagens. O que já desenvolvemos no Brasil é a utilização do poliéster pós-consumo, chamado PET – PCR, que já pode ser encontrado em filme para embalagens termoformadas, por exemplo.

É certo que o potencial da indústria de alimentos é gigantesco. Por essa razão, é urgente o desenvolvimento de um arcabouço regulatório estruturado para que o setor alimentício possa ter acesso a soluções de proteção que contem com embalagens seguras desenvolvidas a partir de conteúdo reciclado. No Brasil, uma regulamentação da ANVISA que garanta a segurança do material para diferentes produtos, como por exemplo o polietileno reciclado, seria um grande passo para o avanço da circularidade na indústria alimentícia.

Nos últimos anos, a indústria de alimentos tem investido fortemente em inovação que ajudará a alcançar um futuro mais sustentável. Tecnologias de reciclagem avançada e recuperação estão transformando plásticos usados em novos produtos, no lugar de depender de recursos virgens para a produção de novos materiais poliméricos. A reciclagem avançada, como por exemplo a reciclagem química, refere-se a vários processos diferentes para extrair valor de plásticos usados, convertendo-os em seus blocos de construção originais, especialidades químicas e outros produtos valiosos. As tecnologias de reciclagem avançada complementam os esforços contínuos de reciclagem e podem ajudar a reduzir drasticamente a quantidade de resíduos enviados para aterros, gerando uma gama diversificada de produtos comercializáveis.

Nos EUA, por exemplo, várias indústrias estão investindo em negócios de reciclagem e processamento. Algumas por meio de aquisição e outras por meio da criação de centros próprios, que contemplam desde reciclagem mecânica a sistemas de processamento avançado.

Outro ponto importante é que as instalações avançadas de reciclagem e recuperação podem ter um impacto significativo na produção econômica e na criação de novos empregos, o que ajudaria e muito no contexto de reciclagem informal no Brasil. Usando os dados da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (United States Environmental Protection Agency – EPA) de 2018 como base de referência, o American Chemistry Council (ACC) descobriu que os EUA poderiam apoiar mais de 150 novas instalações avançadas de reciclagem, o que poderia resultar em 48.500 empregos, sendo 12.500 empregos diretos.

Por lá, atualmente em alguns estados há articulação por parte das associações de embalagens e plástico para que haja pontos de coleta de embalagens flexíveis distribuídas no varejo. Já para o consumidor, nos EUA há também esforços da indústria de alimentos junto às agências federais para unificação da comunicação, a fim de levar mais informação para quem compra e reforçar o incentivo ao descarte correto.

Globalmente, a meta para reciclagem de embalagem plástica aumenta a cada ano. Para atingir esta meta e ir além, acredito muito no potencial da indústria de alimentos. Afinal, do outro lado da cadeia, as embalagens que já chegam hoje no mercado, como as flexíveis, já podem estar prontas para reciclagem (Recycle-Ready: testadas em laboratório com protocolos globais de reciclabilidade). Então, com tecnologia e boa estrutura regulatória, a indústria de alimentos também poderá contar com soluções de embalagens mais inovadoras, sustentáveis e, sobretudo, seguras.

(Fonte: Valor Econômico, 24 de agosto de 2023)